Eu sinto como se vivesse um inferno na minha cabeça. Não há paz em meio a tantos pensamentos. Muitos deles emergem com voraz brutalidade e intenção de me fazer sentir mal. Isso acontece por memórias de erros do passado ou situações escrotas que vivenciei ou do qual me sinto, subconscientemente, culpada por ter feito outros passarem. Ou então quem assume é meu caráter ansioso, revelando as distâncias dos desejos, as dificuldades e todo tipo de desvirtuamento que pode ocorrer que me impeça de conseguir o que quero. E sobre a situação presente, vem me apontar tudo aquilo que eu devia fazer mas não estou fazendo (porque não quero), ou aquilo que estou fazendo e que é, ou pode ser, um erro. Na tortura do presente, encaro a constância nas formas de errar que podem me afastar de um acaso feliz. Isto é, a própria ansiedade me afastando do meu acaso feliz, bombardeando minha segurança.
A essa altura você já deve ter percebido que eu vivo em uma mente perturbada. Substancialmente, muitas das atuais neuras dizem respeito a como não estou me relacionando suficientemente com as outras pessoas a ponto de criar vínculos significativos que marquem a minha presença no mundo. A ansiedade que vivo me lembra a fúria viking pela guerra, onde o maior privilégio era o de ser morto em combate, de ser lembrado, marcando o mundo com a própria existência.
O som noise, a barulheira do metal extremo, especialmente o chiado alternado com os berros do crust punk, emergem, em mim, uma forma de organizar meus lapsos. As críticas destrutivas e as dores autoinfligidas à minha inteligência são anestesiadas. O ruído exorciza, em mim, toda a insegurança de uma semana inteira e o meu corpo se movimenta em um frenesi de liberdade. E quando o pogo se forma, parece ser a reunião que eu esperei a vida inteira: ninguém quer saber, ninguém se importa com os problemas que bombardeiam minha sanidade, ao mesmo tempo que constitui uma organicidade que supre minha carência de pertencimento. E, em momento algum, minhas preocupações essenciais se afastam verdadeiramente de mim, já que a indignação que me move é a mesma que move esse tipo de música.
Se eles pensam no que eu também penso, a própria música é o resultado desses pensamentos. Eu passo a ter algo concreto com que me apoiar, tal como sentisse que minha sanidade não está perdida. Há algo lindo, épico e estrondoso partindo das mentes insanas. Me faz pensar que, talvez, a tortura que vivo dentro da minha cabeça possa ter valor potencial. Que coisas inquietantes, maravilhosas ou lindas pode resultar de uma mente fodida?
(Ecoou Aus-Rotten enquanto construía esse texto. Fica aí a indicação da faixa ‘sexist appeal’ para os leitores dessa merda)
Vic Morphine. Bikker carioca, diretora de escola, camelô e socióloga.
30 04 2020
***************************************************
O PROJETO Mulheres em 40ntena: 40 textos femininos durante o período de isolamento social de norte a sul do Brasil. Leia, curta, comente, compartilhe e envie você também seu post de FB, trecho de díário, aquelas linhas que vocês escreveu e amassou ou um pouco do que está preso no peito. A escrita liberta! Nossas histórias são também de outras mulheres.
Fale com a Revista Pedaleiras em CONTATO ou no zap 21993272560.
Comments